Acesso à Literatura Para Conhecimento, Autoconhecimento e Transformação.
A literatura sempre esteve presente na vida das pessoas, independentemente do povo e do momento histórico. Seja na linguagem oral ou escrita a literatura, com seu potencial comunicativo e educativo, transmite os valores sociais, nos faz navegar por mares inexplorados ou até mesmo denuncia os estados das coisas, como o fez Carolina Maria de Jesus. Porém, nem todo mundo afirmaria que o acesso e a produção literária poderia ser um direito humano, independentemente da raça, classe, orientação sexual, gênero e outras questões sociais.
Você já imaginou se todas as pessoas reivindicassem o direito de acessar obras literárias da mesma forma que reivindicam o acesso à saúde, educação, moradia justiça e etc.? Você acredita no potencial transformador das obras literárias, no direito das pessoas se comunicarem pela escrita literária e na necessidade de terem uma biblioteca perto de casa? O IBEAC acredita que sim!
Está em nossas raízes
Há quase quarenta anos, nós do Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário – IBEAC, temos realizado ações que buscam a defesa e garantia dos direitos humanos, valorizando a diversidade humana e atuando em diferentes realidades. A literatura sempre esteve presente em nossos projetos e ações.
No início dos anos 2000, o IBEAC, em parceria com os jovens agentes de Direitos Humanos do Núcleo Cultural Força Ativa, criou a “Biblioteca Comunitária Solano Trindade” atuante até hoje, na Rede LiteraSampa.
Em 2009, criou em conjunto com um grupo de adolescentes a Biblioteca Comunitária Caminhos da Leitura, inicialmente instalada em uma Unidade Básica de Saúde, depois transferida para a antiga casa do coveiro no Cemitério do Colônia, em Parelheiros, tornando-se referência em gestão e mediação de leitura protagonizada por jovens. A “Caminhos da Leitura” faz parte da Rede LiteraSampa, composta por outras 12 bibliotecas que, juntas, realizam outros projetos de incentivo à leitura, como o projeto-ação idealizado pelo IBEAC Literatura e Direitos Humanos: para ler, ver e contar. Tal processo tem como objetivo o reconhecimento dos Direitos Humanos através da leitura e debate de obras literárias. A Rede LiteraSampa, por sua vez, integra a Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias (RNBC) da qual o IBEAC participa ativamente.
E não é só na Biblioteca Comunitária que a literatura está presente. o Centro de Excelência em Primeira Infância em São Paulo, estimula e promove a contação de histórias e mediação de leitura, criando laços afetivos e acolhimento entre os bebês, as mamães e toda comunidade. As Amaras do Amara Cozinha participam de formações e rodas de conversa, mediadas pela literatura, sobre empoderamento feminino e geração de renda para mulheres. O Acolhendo em Parelheiros aproxima jovens mediadores de leitura e agricultores através do agroturismo. Ainda, os/as visitantes participam de roteiros que envolvem compartilhamento de contos populares, gincanas literárias, narrativas de vivências relacionadas ao território e ao trabalho e mediação de leitura. Em todos os espaços onde acontecem os projetos há um acervo literário.
Mas por que apostamos tanto na literatura?
Porque a literatura nos humaniza
Primeiramente, partilhamos da mesma concepção que Antonio Candido, crítico literário, traz em seu texto “Direitos Humanos e Literatura”, como humanização “(…) o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor.”. Portanto, os processos de alteridade, as infinitas possibilidades de aprendizagem, os nossos sentimentos, tudo isso nos torna tipicamente humanos. E podemos utilizar a literatura para promover essa humanidade, uma vez que “A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante”.
E nesse processo, é imprescindível considerar o respeito às diferenças. Paulo Freire, educador popular, patrono da educação no Brasil em seu livro Pedagogia da autonomia, afirma que “a prática preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofende a substantividade do ser humano e nega radicalmente a democracia”. O desrespeito é uma prática do não reconhecimento da humanidade nos sujeitos. Portanto, a literatura pode nos localizar nesse lugar do outro, através da prática da alteridade reconhecer a humanidade nas diferenças.
Porque a literatura nos transforma
Apostamos na literatura porque acreditamos no seu poder transformador. Ninguém sai intacto depois de ler um ler um livro. Com eles, os livros, viajamos, vivemos outras vidas, outras histórias. As fabulações e ficções, molas propulsoras da literatura, têm o poder de atuar em nossa subjetividade, nos constituindo enquanto sujeitos. E por nos transformar, faz de nós sujeitos ativos de transformação do mundo. Livros podem nos tocar profundamente e nos mobilizar a mudanças internas e externas, de forma individual ou coletiva.
O acesso à produção literária não deve ser um privilégio de poucos. Deve ser garantido como Direito Humano. Acreditamos no poder transformador da literatura e lutamos para que todas as pessoas tenham o direito de acessá-la e produzi-la.